segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

35 anos sem Tommy Bolin


Quantas pessoas você conhece que, com 22 anos, assumem a responsabilidade de substituir o dono de um grande grupo de rock, e com 24 anos torna-se a referência musical para quatro monstros do rock, liderando a guitarra de uma das mais importantes bandas do hard rock mundial?

Bolin ao vivo
Bom, eu conheço apenas três pessoas que foram capazes dessa façanha: Eric Clapton (Yardbirds e Cream), Jimmy Page (Yardbirds e Led Zeppelin) e Tommy Bolin. Porém, os dois primeiros surgiram na década de 60, em um cenário efervescente, onde em cada esquina do mundo nascia uma pequena banda de rock, com fortes chances de conseguir o sucesso através de algum hit, e depois, navegar no mar da obscuridade, o que convenhamos, não foi o caso do Cream e tampouco do Led Zeppelin.

Mas Tommy Bolin viveu uma vida diferente dos outros dois gênios da guitarra. Mesmo Clapton tendo começado com apenas 18 anos no Yardbirds, e com 21 montado o Cream, sua carreira, em termos de ascensão, é incomparável ao que o jovem guitarrista americano conquistou.

Bolin nasceu no dia 1º de agosto de 1951, na cidade de Sioux, Iowa. Desde cedo, ele teve inclinação para a música, e com oito anos já estava tirando os primeiros acordes no violão. Na entrada da adolescência, Bolin passou a integrar diversas bandas de Sioux, até que sua família mudou-se para Boulder, Colorado. Lá, ingressou no grupo American Standard, onde começou a criar uma boa reputação.

Zephyr: Bobby Berge, John Faris, David Givens, Candy Givens e Tommy Bolin


Irreverante, com roupas chamativas e um corte de cabelo diferente dos demais membros do American Standard, além de uma voz poderosa e uma habilidade incrível na guitarra, não demorou para que o pessoal do grupo Ethereal Zephyr chamasse o garoto, com apenas 18 anos, para assumir o posto de guitarrista principal. Ao lado de John Faris (teclados), Robbie Chamberlin (bateria), David Givens (baixo) e sua esposa, Candy Givens (vocais), Bolin foi responsável pelo lançamento dos dois primeiros discos do agora batizado Zephyr. Batizados de Zephyr (1969) e Going Back to Colorado (1971), o último contando com Bobby Berge na bateria, esses dois álbuns, hoje preciosidades a serem conhecidas pelos admiradores da música, revelam um ainda tímido Tommy Bolin, fazendo solos curtos, mas mostrando a agilidade da mão direita em levadas espetaculares. A fusão de psicodelia com southern music era a principal atração do Zephyr, e, principalmente, a voz de Candy Givens (uma espécie de Janis Joplin misturada com Grace Slick) sem dúvidas era o referencial. Canções como "Raindrops" e "Cross the River", pertencentes ao primeiro álbum do grupo, "Miss Libertine"  e "Take My Love", são alguns dos bons exemplos da capacidade musical do Zephyr, que os levou a participar da edição do Texas Pop Festival de 1971.

Ao lado de Candy Givens


Mas o sucesso do Zephyr, que também os levou a abrir um show do Led Zeppelin durante a passagem dos britânicos pelo Colorado, fez alguns produtores virarem os olhos para o jovem guitarrista do grupo. A atração pelo sucesso, e a falta de sintonia com a música do Zephyr, fez Bolin abandonar o barco. Na realidade, Bolin já havia entrado em dois mundos de onde, depois que você entra, dificilmente sai.

O primeiro deles, o mundo de Miles Davis. Bolin pirou com as experiências sonoras de Davis no álbum Bitches Brew (1970), e, posteriormente, A Tribute to Jack Johnson (1971), e assim, decidiu voltar-se para o jazz e para o blues. O segundo mundo é o mundo das drogas. Com o Zephyr, Bolin descobriu a maconha e rapidamente evoluiu para a cocaína, da qual virou consumidor ativo. 

Ao vivo com o Energy, em 1972


Com muitas viagens na cabeça, Bolin criou o Energy, um grupo fortemente influenciado por Miles Davis, mas que nunca chegou a gravar um disco com o guitarrista. O período tocando com o Energy chamou a atenção do baterista panamenho Billy Cobham. O músico, que havia participado de A Tribute to Jack Johnson, agradou-se ainda mais do garoto quando ele disse que era seu fã, e que seria um prazer tocar ao lado do melhor baterista que já havia ouvido.

Essencial disco de Billy Cobham, com a participação de Bolin


Bolin então registrou sua guitarra no álbum Spectrum, uma obra-prima lançada por Billy Cobham em 1972, que, além de Bolin na guitarra, possui a participação de Leland Sklar (baixo) e Jan Hammer (teclados), além de outros músicos de menor expressão. Nesse disco, surgiu finalmente o Bolin pelo qual o mundo se apaixonaria três anos depois. As notas leves, acordes swingados e a levada da mão direita são algumas das características que Bolin registrou nos sulcos de Spectrum. Canções como a agitada "Taurian Matador", onde trava um duelo feroz com os teclados de Hammer, a impressionante "Stratus" e a swingada "Red Baroon", duelando com os teclados de Hammer, dessa vez em um swing leve, embriagante e sensacional, são uma boa amostra do talento de Bolin.

James Gang: Tommy Bolin, Dale Peters, Jim Fox e Roy Kenner

A participação do guitarrista em Spectrum foi crucial para que Jimmy Fox, baterista do James Gang, escolhesse Bolin para substituir Dominic Troiano em seu grupo. Dominic havia entrado para o lugar de Joe Walsh, um exímio guitarrista que levou o James Gang ao topo das paradas através de álbuns essenciais como 'Yer Album (1969) e Rides Again (1970). Com 22 anos, muitos duvidaram que Bolin fosse capaz de aguentar a pressão de ser o guitarrista de uma banda famosa e com mais de oito anos de carreira.

 
Os dois álbuns de Bolin com a James Gang


Pois Bolin superou essa dúvida com sobras, registrando os maravilhosos Bang (1973) e Miami (1974). Com o James Gang, Bolin pôde aperfeiçoar sua técnica no violão e nos teclados, e nesses álbuns, fez algumas de suas principais gravações, destacando "Standing in the Rain", "Ride the Wind" e a emocionante "Mystery" (de Bang), e "Cruisin' Down the Highway", "Wildfire" e "Head Above the Water" (de Miami). Os vocais suaves de Bolin também aparecem com destaque na linda "Alexis", de Bang. Já a guitarra carregada de efeitos das demais canções, criava uma sonoridade inédita, que chamava a atenção de diversos novos seguidores do James Gang. Para a carreira de Bolin, o crescimento como compositor era algo cada vez mais notório.

Bolin com Alphonse Mouzon, segundo da direita para a esquerda (abaixo);
e a capa do álbum Mind Transplant (acima)


Depois da turnê de divulgação de Miami, Bolin tentou se afastar da cocaína, na qual já estava bastante viciado. A solução foi virar músico de estúdio, e assim, Bolin começou a pensar em investir em uma carreira solo. Nesse período, participou de diversos registros como músico convidado, destacando outro grande álbum do jazz rock setentista: Mind Transplant (1974), do baterista Alphonse Mouzon, onde deixou pelo menos mais dois petardos sonoros para a posteridade: a faixa-título, "Carbon Dioxide" e "Golden Rainbows", onde os solos são carregados dos efeitos que já apareciam nos discos da James Gang.

Bolin: virtuoso e talentoso
Ainda em 1974, Bolin assinou contrato com a Nemperor Records para gravar seu primeiro álbum solo. Para isso, apoiou-se nos ombros dos gigantes David Foster (arranjos), David Sanborn (saxofone), Jan Hammer (teclados), Phil Collins (bateria) e Glenn Hughes (baixo). Durante a gravação do primeiro álbum, dois fatos mudaram a vida de Bolin.

O primeiro deles foi a aparição do grupo canadense Moxy na Califórnia. Bolin estava fazendo uma sessão de gravação no mesmo estúdio do Moxy, e ficou impressionado com a sonoridade dos canadenses, que estavam gravando seu primeiro e fundamental álbum. Fascinado com o som do grupo, Bolin ofereceu seus trabalhos para a banda, o que foi prontamente aceito, já que Bolin, além de ser um boa pinta, também tinha um estilo que se encaixava ao que estava sendo buscado pelo Moxy.

Um clima de harmonia surgiu nos estúdios e após as diversas sessões, quando o Moxy já estava pronto para convidar Bolin para oficialmente se tornar o principal guitarrista do grupo - lembrando que o Moxy contava na época com o sensacional guitarrista Earl Johnson, além de "Buzz" Shearman (vocais), Bill Wade (bateria) e Tery Juric (baixo) -, eis que um convite de David Coverdale chegou para Bolin: "você está convidado para ser o novo guitarrista do Deep Purple".


Um dos principais nomes do hard mundial, o Deep Purple estava na ativa havia pouco mais de oito anos, mas já havia deixado sua marca em álbuns como In Rock (1970), Machine Head (1972) e Burn (1974). Porém, a Mark III naufragou em uma guerra de egos, levada principalmente pelo guitarrista Ritchie Blackmore. David Coverdale (vocais) foi o primeiro a incentivar a entrada de Bolin, convencendo Ian Paice (bateria), Jon Lord (teclados) e Glenn Hughes (vocais) de que mesmo Bolin tendo apenas 24 anos, era possível que ele cobrisse as partes de Blackmore ao vivo, e ainda mudar de vez o som do Purple (algo que estava ocorrendo desde a entrada de Hughes e Coverdale em 1973).


A estreia do Moxy, com Bolin nas guitarras


Como não tinha um vínculo oficial com o Moxy, Bolin preferiu seguir carreira ao lado do Purple, deixando para o pessoal do Moxy uma excelente contribuição, através de Moxy, o álbum de estreia do grupo, que foi lançado em 1975. Essencial na discografia de qualquer apreciador do hard setentista, Moxy exalta ainda mais as qualidades de Bolin, destacando "Fantasy", "Moon Rider" e "Train". 

A estreia solo de Bolin


Ainda em 1975, Bolin completou seu álbum de estreia, Teaser, o qual chegou às lojas no dia 17 de novembro do mesmo ano. Trazendo diversos convidados, dos quais além dos citados anteriormente também é necessário chamar a atenção para a participação do baterista Jeff Porcaro, Teaser é um álbum dançante, envolvente e muito gostoso de se ouvir. Bolin desfila suas notas na guitarra, mergulhando profundamente sua voz clara em canções marcantes, como "The Grind", "Savannah Woman", "People, People" e a super clássica "Wild Dogs". Outro grande destaque é a participação de Glenn Hughes na faixa "Dreamer".

Jam session que levou Bolin a assumir as seis cordas do Purple


Pouco antes, em junho de 1975, Bolin participou de uma jam session com o Deep Purple, a qual resultou na aprovação de Bolin para as seis cordas do Purple. Bolin chocou a todos quando chegou com suas roupas coloridas e um visual muito extravagante. Mesmo tendo passado pela James Gang, Bolin ainda era um tímido garoto loiro, mas que, ao empunhar a guitarra, transformava-se em uma fera indomável. A jam deixou todos no estúdio de boca aberta, com Bolin sendo efetivado no cargo na hora. O mais interessante de tudo é que Bolin nunca havia ouvido uma canção sequer do Purple, mas a harmonia criada com Paice, Lord e Hughes (principalmente) foi como a união do queijo com a goiabada.

Mark IV do Deep Purple: David Coverdale, Jon Lord e Tommy Bolin (acima);
Ian Paice e Glenn Hughes (abaixo)


A entrada de Bolin deu origem à chamada Mark IV, e mudou totalmente o Deep Purple. Se antes, Lord e Paice eram os líderes (ao lado de Blackmore), Bolin de tornou o mentor do quinteto britânico. Sua palavra era sempre a última, e sua influência marcou bastante os colegas do Purple, principalmente Hughes, que, além de dividir o palco e os estúdios com Bolin, passou a dividir heroína com o guitarrista.

Come Taste the Band, único registro de estúdio da Mark IV


A Mark IV lançou Come Taste the Band em 1975. Na época, a sonoridade funkeada do LP não agradou aos fãs da fase pesada da Mark II e da Mark III. Porém, hoje a maioria dos fãs aplaudem e reverenciam o álbum, que traz aquele que é o melhor momento de Tommy Bolin: a canção "Owed to G", um belo tema instrumental onde Bolin simplesmente detona na guitarra. Outro grande destaque desse LP é "You Keep on Moving", canção que encerra o álbum e que concretiza a obra talentosa de Bolin tanto como guitarrista quanto compositor. 

Bolin, provando algo "diferente"
Porém, durante a turnê de divulgação do LP, a coisa começou a naufragar. A turnê começou pelo Japão, e pouco antes, Bolin, que havia ficado todo o tempo da gravação de Come Taste the Band sem injetar heroína, abusou da dose antes da primeira apresentação em Nagoya. O resultado: teve o lado direito de seu corpo paralisado, tendo que subir no palco somente para fazer as bases, e mesmo assim com muita dificuldade.

Bolin deu sinais de melhora quando o grupo chegou em Tóquio, três shows depois, mas mesmo assim não conseguiu fazer no Japão uma apresentação à altura de seu talento. Como Bolin estava em dificuldades de recuperação, a data de Hong Kong acabou sendo cancelada, com a banda fazendo um recesso de fim de ano, onde Bolin tentou se livrar das drogas, assim como começou a compor novas canções.

Em 14 janeiro de 1976 o Deep Purple voltou à estrada, fazendo uma turnê pelos Estados Unidos, que acabou em 4 de março, sem maiores problemas com o vício de Bolin, partindo então para cinco datas pela Grã-Bretanha: Leicester, Wembley Arena (por duas noites consecutivas), Glasgow e Liverpool. Foi exatamente em Liverpool que o barco afundou de vez. Bolin novamente abusou, perdendo totalmente o controle de tudo o que fazia no palco durante praticamente todos os shows britânicos, mas em Liverpool ele ficou totalmente imóvel, sem nem consguir ficar em pé, quanto menos segurar a guitarra. Coverdale deixou o palco aos prantos, confidenciando a Lord que estava saindo do Deep Purple. Sem Coverdale, Hughes também pediu as contas, e assim, Bolin foi oficialmente demitido, com Lord e Paice decidindo dar um ponto final à carreira do Deep Purple em junho de 1976. 


Robert Plant, Glenn Hughes e Tommy Bolin


Bolin então investiu em sua carreira solo, e aproveitando-se de que já havia conquistado um nome entre os grandes músicos de sua geração, lançou-se em uma bem sucedida turnê, ao lado de músicos como Narada Michael Walden (bateria), Jimmy Haslip (baixo), Mark Stein (teclados), além de seu irmão Johnnie Bolin (bateria) entre outros de menor expressão.

Segundo (e último) registro solo de Bolin


Em 1976, assinou com a CBS e lançou seu segundo disco solo, Private Eyes. Nele, mais canções marcantes, destacando "Someday Will Bring Our Love Home", "Bustin' Out for Rosey" e "You Told Me That You Loved Me", que fizeram de Private Eyes o mais bem sucedido álbum solo de um ex-Purple até aquele momento. O sucesso de Private Eyes levou Bolin a abrir para Jeff Beck, o qual estava no auge da sua fase fusion.

Mas, infelizmente, ele não pôde aproveitar o sucesso do álbum. No início da manhã de sábado do dia 04 de dezembro de 1976, sua namorada o encontrou inconsciente, e poucas horas depois, Bolin foi declarado oficiallmente morto, vítima de uma overdose de heroína. Com apenas 25 anos, um dos maiores talentos da guitarra perdia sua guerra contra o vício. Bolin foi enterrado na cidade de Sioux, tendo em seu dedo anelar o mesmo anel que Jimi Hendrix estava usando quando faleceu, mais uma curiosidade do rock.

Last Concert in Japan: primeiro ao vivo oficial a contar com a guitarra de Bolin


Com o passar dos anos, diversos relançamentos vêm resgatando a obra de Bolin, destacando os lançamentos da Purple Records. Em 1977, foi lançado Last Concert in Japan, trazendo, como o nome diz, a última apresentação da Mark IV na terra nipônica. Depois, Days May Come and Days May Go (2000), o qual traz a jam session na qual Bolin foi aprovado para ser o guitarrista do Purple, e também This Time Around: Live in Tokyo 75 (2001), trazendo a cobertura da turnê japonesa da Mark IV, aumentaram o material de Bolin. Outros destques vão para a caixa Tommy Bolin: The Ultimate Collection, lançada em 1989 e que traz um apanhado geral da carreira do guitarrista, a série Whips and Roses I e II, lançadas em 2006, com muitas sobras de estúdio dos álbuns Teaser e Private Eyes, bem como versões ao vivo, e o ao vivo Tommy Bolin & Energy - Live in Boulder 1972 (2003), trazendo uma rara apresentação do músico com o Energy.

Porém, esses lançamentos, apesar de extremamente valiosos, servem apenas para aumentar nossa lástima pela perda de um guitarrista genial, que influenciou pessoas muito mais experientes que ele, e que em sua curta estadia na Terra, conquistou uma enorme geração de seguidores, apreciadores e músicos que ainda tentam tirar de suas guitarras os endiabrantes timbres que Bolin tirava de seu instrumento.

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