quarta-feira, 1 de abril de 2009

Asia


 Hoje, primeiro dia abril, dia dos bobos em muitos lugares por aí afora. Dizem que a origem disso está na França, onde, a partir do século XVI, o ano novo era festejado na data de 25 de março e as festas duravam até o dia primeiro de abril. Com a adoção do calendário gregoriano, o rei francês Carlos IX resolveu seguir o critério que conhecemos hoje (com o ano novo sendo comemorado em primeiro de janeiro). Porém, muitos franceses negaram-se à tal mudança, comemorando a chegada de um novo ano em primeiro de abril, o que gerou diversas gozações por parte dos demais franceses, e assim, surgia o dia dos bobos. 

No Brasil, esse dia começou a ser difundido no nordeste, onde o jornal A Mentira lançou, nesta data em 1848, a notícia do falecimento de Dom Pedro, desmentida no dia seguinte. O jornal ainda armaria mas uma peripécia, convocando todos os credores para um acerto de contas no dia 1º de abril do ano seguinte, dando como referência um local inexistente. 

Ainda existe a versão da guerra entre pagões e católicos. Os pagões, também como os franceses, comemoravam o ano novo em primeiro de abril, gerando gozações do povo católico, que adotou o novo calendário. Quem acompanha o horóscopo percebe que o primeiro signo, Áries, justamente se refere ao mês de abril. Enfim, histórias que não sabemos qual é a correta, mas que serviram para construir toda uma temática sobre o dia de hoje, o "dia dos bobos".
E várias vezes me senti desta forma, como um bobo. Mas com certeza, a mais marcante foi quando ouvi uma super banda, a qual continha três dos meus quatro ídolos de um determinado instrumento em sua formação. O nome do grupo: Asia.A idéia de super banda é antiga no mundo do rock. Se não vejamos: quando Jimmy Page substituiu Jeff Beck nos Yardbirds, e depois Beck retornou, tivemos o primeiro super grupo conhecido do público, contando com dois ótimos guitarristas e que fazia muita sonzera ao nível do talento dos dois. A união de Eric Clapton e Duane Allman no Derek and The Dominos também pode ser interpretada como mais uma super banda, bem como a Blind Faith, que contava com metade do Cream (Clapton e Baker) e metade do Traffic (Steve Winwood e Rick Grech), essa sim, uma baita super banda. 

E no progressivo? Bom, no progressivo a maioria das bandas que existiam eram super grupos por natureza, mas sempre existia uma idéia de mesclar um fulano daqui com um fulano dali e montar outro baita grupo. Exemplo maior foi na dissolução do King Crimson pela primeira vez, em 1969, que, com a fusão de membros do Nice e do Atomic Rooster, acabou gerando o ELP, mas poderia ter gerado o HELP (isso mesmo, Hendrix, Emerson, Lake & Palmer) ou o ELM (Emerson, Lake & Mitchel), já que a dupla Emerson/Lake fez vários ensaios com a galera do Experience, mas o ego do deus negro da guitarra impediu de vermos algo inimaginável nos palcos.

Por fim, quando o King Crimson se separou pela segunda vez, em 1974, surgiu a idéia de montar um projeto entre os ex-King Crimson John Wetton e Bill Bruford com o recém saído do Yes Rick Wakeman. Assim tivemos o British Bulldog, que durou apenas alguns ensaios, mas foi o embrião de uma poderosíssima banda chamada U.K., a qual contava ainda com Allan Holdsworth e que merece uma resenha só para ela.

Antes, Wetton ainda deu uma passada pelo Uriah Heep, onde dividiu os vocais com o mestre David Byron. A U. K. fez sucesso mesmo sem contar com Bruford em seus últimos álbuns, mas acabou durando pouco. Wetton passeou no Wishbone Ash e então, com uma carreira mais que consolidada, decidiu seguir montar um novo projeto, investindo pesado em seus companheiros, e aí entra o dia dos bobos na jogada. 

O ano era 1980, mesma data do fim do Yes. Um ano antes, a ELP aposentava-se prematuramente. Desta forma, o guitarrista Steve Howe e o baterista Carl Palmer, dois monstros em seus instrumentos, estavam disponíveis para trabalhar. Aproveitando-se disso, Wetton convidou Howe para a nova banda, sendo que Howe sugeriu o ex-Yes e ex-Buggles Geoff Downes para os teclados. Downes havia substituído muito bem Rick Wakeman no Yes, mostrando que mesmo sendo um garoto na época conseguia reproduzir os incríveis solos de Wakeman em clássicos como "And You and I" e "Roundabout", e também inovando com o uso de novos sintetizadores. A base do Asia começava a ser formado.

Palmer apareceu através do convite de Wetton, que também contatou Trevor Rabin para duelar com a guitarra de Howe (a idéia era uma super banda mesmo), o que ficou registrado em raríssimos ensaios. Porém Rabin preferiu seguir com Squire e White, substituindo Jimmy Page no projeto XYZ e criando o Yes-West, o qual virou o novo Yes com o retorno de Jon Anderson aos vocais.

Tínhamos então nada mais nada menos que o baixista e vocalista do King Crimson John Wetton, o baterista do ELP, Carl Palmer, mais o guitarrista e tecladista do Yes, Steve Howe, e Geoff Downes, em uma mesma banda. O que esperar desse grupo com esses montros do progressivo? Ora, somente uma coisa: muitas suítes, longos improvisos, letras viajantes, complicadas e intricadas peças sonoras, e todas as características que marcaram o rock progressivo.

Mas, infelizmente (para alguns), o que se viu foi uma banda voltada para um cenário que estava começando a surgir, o chamado AOR - Adult Oriented Rock, onde todas as características principais do progressivo caíam por terra, trabalhando mais em uma linha pop e comercial, onde destacaram-se bandas como Journey, Boston, Alan Parsons Project e Kansas (esse último outro pecado). No Asia, o talento de Palmer e Howe acabaram afundados como músicos de estúdio, os improvisos sumiram, as letras sobre montros, misticismo e guerras foram trocadas por histórias de amor, romances inesperados e brigas de casais, enquanto os teclados de Downes tomaram conta de um rock preguiçoso e sem vontade.


O primeiro álbum, Asia, foi lançado em 1982, contando com uma bela capa de Roger Dean (mais um ponto para esperar-se um grande trabalho progressivo), e acabou tendo um sucesso enorme, principalmente nos Estados Unidos, onde foi considerado o disco do ano pela revista Billboard. Com o apoio da MTV, o Asia lotou estádios e sua música foi sinônimo de participações em eventos esportivos. 

O disco abre com o hit "Heat of the Moment", com a guitarra de Howe introduzindo os vocais roucos de Wetton, enquanto Palmer marca o tempo no chimbal. Então, os vocais de todos os vocalistas trazem o refrão, cercado por teclados e uma marcação simples de bateria, diferente de tudo o que já haviam feito anteriormente em suas carreiras. Temos uma pequena sessão instrumental, mas sem muita complicação, retomando a letra e o refrão meloso, encerrando com um solo de Howe sem muita criatividade. 

E assim fica o disco, sem criatividade e sem empolgação, com a faixa "Only Time Will Tell", que mesmo contando com os teclados introdutórios, cai em uma balada acompanhada de pianos elétricos e a famosa batida anos oitenta (bumbo-caixa, bumbo-caixa, acho que vocês conseguem entender o que escrevo). Outro refrão grudento surge, o que fez dessa canção mais um hit. Vale destacar o trabalho de Steve Howe executando os backing vocais nessa canção, cantando o nome da mesma bem como colocando pequenas intervenções de guitarra que tornam a faiza um pouco mais interessante. 

"Sole Survivor" já tem uma introdução mais pesada, com guitarras e teclados acompanhados pela cozinha de Wetton e com Palmer mostrando seus trabalhos, até que enfim. Quando Wetton assume os vocais, voltamos novamente ao popzão das faixas anteriores, com outro refrão para levantar estádios. Mesmo assim, os momentos instrumentais são interessantes, lembrando bastante o álbum Drama, lançado pelo Yes em 1980. "One Step Closer" é mais uma que começa com uma boa introdução, contando com o timbre tradicional da guitarra de Howe, mas que peca pela falta de criatividade e pela simplicidade de Palmer. 

O lado A encerra com uma música composta pelo quarteto, "Time Again", a qual começa com baixo e guitarra, acompanhados pelos teclados e bateria. Temos aqui a melhor faixa do álbum, bem rock'n'roll, com boa pitada de anos oitenta principalmente no refrão, mas que é disparada melhor que as demais. Essa canção é uma das poucas onde Palmer pode mostrar seu talento e que Howe sola com vontade.



O lado B abre com outra boa introdução, agora de "Wildest Dreams", mas dessa vez os tecladinhos oitentistas voltam à ativa. A canção ainda conta com algumas marcações um pouco mais trabalhadas e uma boa participação de Palmer, mas nada que empolgue. "Without You" também tem uma bela introdução, mantendo o AOR, assim como a faixa seguinte, "Cutting It Fine", a qual traz uma boa linha instrumental, mas peca bastante na parte vocal. O álbum encerra com "Here Comes the Felling", que mantém as linhas melosas das faixas anteriores, sem destaques maiores. Asia contou com a participação direta de Howe nas composições, o que se faz claro na presença da guitarra com destaque na maioria das faixas, porém o segundo álbum já foi diferente.



Alpha, lançado em 1983, manteve a linha AOR, com um domínio maior de Wetton, que compôs todas as músicas. O disco abre com o super hit "Don't Cry", seguindo a linha de boas introduções instrumentais com refrões melosos e batidas anos oitenta. O clip dessa canção rodou, e muito, nas telinhas brazucas, onde cada integrante interpreta um determinado personagem, com destaque para a hilária participação de Howe. Essa faixa atingiu o número um da Billboard naquele ano. 

"The Smile Has Left You Eyes" vem com os teclados de Downes e a voz de Wetton, deixando bateria e guitarra em total segundo plano. "Never in a Million Years" e "My Own Time (I'll Do What I Want)" são as mais melosas do álbum, com refrões que nem o Roupa Nova sonhou em fazer. O lado A encerra com "The Heat Goes On", que contém uma bonita introdução, mas nada além disso.



O lado B é mais lento, abrindo com "Eye to Eye", bem na linha do primeiro trabalho e contando com boas passagens de teclado. As badalas "The Last to Know" e "True Colors" lembram "Into the Lens" do álbum Drama, com a última tendo um refrão dos mais grudentos possíveis. "Midnight Sun" é uma das poucas que escapa, graças ao solo de Howe, na linha do disco Tormato, gravado pelo Yes em 1978. Por fim, "Open Your Eyes" encerra esse LP com os teclados trazendo os vocais de Wetton. A banda acompanha novamente no ritmo bumbo-caixa. Os teclados ficam viajando por algum tempo, enquanto o nome da canção é repetido dezenas de vezes (criatividade zero!), terminando com solos de Howe e Downes.

Alpha atingiu o sexto lugar na Billboard e ganhou disco de platina. Mesmo com as altas vendas, Wetton saiu da banda e foi substituído por nada mais nada menos que Greg Lake, o qual participou do famoso show Asia in Asia, sendo este filmado no Japão e o primeiro a ser transmitidio via-satélite para os EUA. Quem tiver a oportunidade de ver esse show, pela curiosidade ou por gostar da banda mesmo, vale a pena ir em uma loja especializada ou fuçar na internet para admirar o trabalho de Downes tocando vinte e seis teclados(!), que ocupavam toda a parte traseira do palco.



Wetton retornou ao Asia em seguida, justamente quando a banda trabalhava seu terceiro álbum, Astra (1985), impondo suas letras e suas melodias, o que levou Howe a pedir as contas, já que segundo o próprio ele estava cansado de ficar tocando historinhas de amor. Porém, Howe foi formar outra grupo que também poderia servir de exemplo para o dia de hoje, o GTR, ao lado de outro gênio das guitarras, Steve Hackett, e que, assim como o Asia, pouco produziu ao nível da qualidade sonora que se esperava.


O Asia continuou sua carreira com altos e baixos, tendo posteriormente a liderança do baixista John Payne. Palmer e Howe participaram de uma forma ou de outra do álbum Aqua, de 1992. 



Em 1999, Howe disse que existia uma forte possibilidade de o Asia reunir sua formação original. Porém, ele mesmo pulou fora, após uma coletiva de imprensa anunciando a volta do grupo. Wetton convidou então o guitarrista de sua banda, Dave Kilmister, para substituir Howe, mas aí Downes também seguiu outros rumos. Assim, o duo Wetton/Palmer mais Kilmister e o tecladista John Young (que também era da banda de Wetton) acabaram fazendo uma pequena turnê, com o nome de Qango, e que culminou com o lançamento do raro (já que foi vendido somente pelo sites de Palmer e Wetton) álbum Live in the Hood, onde interpretam obras como "Fanfare for the Common Man", "Hoedown", "Bitches Crystal" e "All Along the Watchower", além de canções do Asia. Em alguns shows, Keith Emerson participou, ressucitando a idéia da volta do ELP, e que não foi vista até hoje.


Downes e Wetton formaram a dupla Wetton Downes, lançando os CDs John Wetton / Geoff Downes (2001), Icon (2005), Icon II - Rubicon (2006), Icon Live (2006), Icon Acoustic (2006) e Icon 3 (2009) nos últimos anos. 


A formação original do Asia retornou para comemorar os vinte e cinco anos da banda em 2006, passsando por diversos países (inclusive o Brasil), tocando faixas dos dois primeiros discos, bem como "Fanfare for the Common Man" (ELP), "Video Killed the Radio Star" (Buggles), "Roundabout" (Yes) e "In the Court of Crimson King" (King Crimson), culminando em 2008 no lançamento do álbum Phoenix, que particularmente para mim é o melhor da banda, com uma boa colaboração das guitarras de Steve Howe. Destaque principalmente para as faixas "Sleeping Giant / No Way Back / Reprise", "Alibis" e ""Parallel Worlds / Vortex / Déyà". Para quem gosta dos dois primeiros álbuns, vale a pena conferir "Shadow of a Doubt" e "Wish I'd Known All Along". Mas como a seção é destinada para a fase vinílica, deixo a você leitor a curiosidade de ir atrás desse belo trabalho.

Bem, para aqueles que curtem o som dos anos oitenta com certeza o Asia não é uma banda tão ruim. Eu mesmo cheguei a essa conclusão depois de ter ouvido coisa muito pior e de muito mal gosto. O que quero apenas ressaltar é que com o timaço que o Asia tinha, todo fã de Yes, King Crimson e ELP esperava uma sonoridade bem diferente, sendo tri enganado ao ouvir coisas como "Don't Cry" e "Heat of the Moment". Algo como o famoso ataque (de risos) Romário-Sávio-Edmundo ou o Quarteto Mágico do Parreira na Copa do Mundo de 2006. Porém, o Asia se transformou em um marco para a geração AOR, sendo cultuado hoje por inúmeros fãs que lotaram as diversas cidades por onde a turnê de vinte e cinco anos passou, mesmo que muitos tenham ido para assitir aos solos de Palmer e Howe ou apenas pelo saudosismo de um tempo que infelizmente não podemos voltar.

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